qualquer coisa
num verso intitulado mal secreto
 

15.4.08


[12:31 AM]

Hoje fiquei sabendo que o pai da menina por quem eu tive uma paixonite boba durante a adolescência morreu, lá na cidade de onde vim. Morreu por escolha própria, numa atitude deliberada que não cabe a ninguém julgar (e cujas razões não interessam à esta escrita). Porque é preciso, antes de tudo, muita coragem pra pular da cobertura de um prédio. E por mais que eu nunca tenha trocado uma palavra sequer com a menina, nem nunca visto ou tomado conhecimento da pessoa de seu pai, essa notícia caiu no meu dia como uma tempestade tropical cai acinzentando céu em dia de verão. Durante toda a infância, nunca soube de nenhuma história de suicídio ligada diretamente à minha pessoa, seja por meio de familiares ou até mesmo de conhecidos. O único caso que eu conhecia era o do Kurt Cobain, que, até onde se sabe, optou por um tirambaço de doze na boca para acabar com a própria vida. Talvez mortes assim possam até ter ocorrido ao meu redor, mas num ato de singelo eufemismo, como que preservando um aspecto asséptico de pureza que existe nas crianças, ninguém nunca me falou nada. Só com a idade é que eu fui descobrir que a tia de fulano tinha tomado uma dose letal de comprimidos e que o primo de sicrano pulou em cima das tendas dos camelôs, do 8° andar do prédio onde morava, para morrer na contramão atrapalhando o tráfego dos que passavam pelo local.

Por isso que hoje, a notícia de que o pai daqueles olhos verdes (cuja beleza quase ninguém na escola reconhecia) morreu veio até mim de forma cruel, que fez com que eu percebesse, dentre outras coisas, o vazio que em algum momento da vida atinge esses 6 bilhões de habitantes espalhados mundo afora. A hora e a vez de cada um de nós há de chegar, portanto não se assuste, pessoa. Em alguns, porém, a presença desse vão emocional é tão dolorida que a opção por escolhas corajosas parece ser o único caminho. E em momentos como esse, bate também, na cara e mais violenta do que nunca, a certeza de que já não existe mais preocupação em esconder as coisas, de que já sou grande o suficiente pra saber que naquele caixão fechado há um corpo que quis se encerrar daquela maneira. São verdades que talvez seriam aceitas com maior facilidade caso não fossem ditas através de palavras. E se aqueles olhos verdes já carregavam consigo uma enorme e natural carga de tristeza, que nesse momento difícil eles possam simplesmente aceitá-la.



 


é isso aí, bicho

 

 


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