[8:31 PM]

Fui lá conferir o novo filme do Batman só agora, um mês depois da estréia mundial e da quebra semanal de recordes, um atrás do outro. Gosto com ressalvas do filme anterior, mesmo tendo-o visto apenas uma vez, ainda no cinema, na época do lançamento. Meu preferido da série continua sendo o segundo dirigido por Tim Burton, mas, como quase meio mundo, tinha boas expectativas para essa continuação comandada por Christopher Nolan. Pois bem, entrei no cinema confiante de que veria uma redefinição do universo dos heróis, mas o que restou ao término da sessão foi uma infernal dor de cabeça, causada pelo deslocamento constante de retina que as seqüências de ação provocam com o pretexto de dinamizar um roteiro que envereda pelo policial, o drama, o suspense e, em menor escala (veja que ironia), o mundo dos super-heróis. Porque, sinceramente, eu paguei o ingresso com o intuito de assistir ao Batman, não o Jack Bauer vestido de morcego salvando o mundo e destruindo Gotham. O Cavaleiro das Trevas, embora seja bem sucedido no reprocessamento de características do cinema de gênero dos anos 70, falha ao ambicionar ser algo além do retrato de um super-herói, numa tentativa vã de escapar dos limites da ficção e propor um embate entre os códigos das duas esferas. Muita ambição para pouco conteúdo. A grande sacada da franquia, que fica evidente a cada filme, é que os vilões possuem uma natureza riquíssima e que precisa ser explorada com maior intensidade a partir de agora. Heath Ledger, o único motivo para enfrentar as duas horas e meia de projeção, está diabólico em sua recriação do Coringa, um autêntico signo do caos. Sua caracterização é minuciosa e desde já eternizou a figura do ator, que já vinha entregando atuações marcantes e cuja morte interrompeu uma carreira de grande potencial criativo. A sequência da enfermeira, que tinha tudo para assumir ares de deboche, incomoda por sugerir uma subversão que sintetiza toda a idéia que tínhamos do personagem e que foi reconfigurada graças à leitura de Ledger e sua perfeita concepção. É o momento que marca o nascimento de um vilão e preconiza a morte de outro, e o duelo entre as duas forças do mal garante o tom de maior intensidade de toda a história. Mesmo assim, ainda espero por um Batman que encare o viés da realidade sem esquecer que, por trás dela, há uma cortina de ficção que não pode e nem deve ser ignorada. * * *
A visita de David Lynch ao Brasil acabou ofuscando a figura de Donovan, trovador britânico que gravou ótimos discos no anos 60 e início dos 70 e que hoje anda pra lá de sumido. Donovan, também adepto da meditação que trouxe Lynch ao Brasil, fez um pocket show ao final de cada palestra concedida pelo cineasta apenas com seu fiel escudeiro, o violão, e aposto que muita gente nem devia saber de quem se tratava. Um dos poucos integrantes do grupo que acompanhou os Beatles à Índia em 1968, só agora fui perceber que uma das melhores e mais famosas músicas do cara está na trilha de Zodíaco, filme do Fincher que deixou muita gente do cinema de quatro no ano passado. Hurdy Gurdy Man, do disco homônimo também de 68, entra em uma das mais poderosas sequências do filme (a da foto acima), logo no início, e acompanha a progressão dos acontecimentos até soar única e cristalina na tela, um deleite para os bons ouvidos. Aliás, revendo o filme agora na HBO (no cinema eu quase dormi, mas admito que, ainda de pé, tô com a língua queimada) é que pude perceber sua força. A primeira hora é magistral, uma recriação do policial made in 70’s com uma polidez que soa diametralmente oposta à pretendida por O Cavaleiro das Trevas, por exemplo. É, ainda, um ótimo recurso de ação que se descentraliza com o objetivo de garantir uma riqueza de exploração psicológica que a mão segura de Fincher trata com muito rigor, sem os maneirismos de seus filmes anteriores.
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Peguei uns trechos de Edifício Master hoje, pela madrugada, no Canal Brasil. Nem preciso atestar a excelência do Coutinho por aqui mais uma vez, mas só agora pude perceber que existe um impressionante diálogo entre a coleção de tipos de seu documentário e a visão de Sganzerla sobre a influência que o bairro carioca exerce nas pessoas, registrada trinta e dois anos antes. É por essas e outras que eu não me canso de dizer que Copacabana Mon Amour é o Brasil, em carne, osso e Ângela.
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