[11:10 PM]

Joel e Ethan Coen continuam sem entender o que aconteceu com a América, mas não deixam de apostar em diversos fatores que se confundem entre si e acabam por apontar uma ferida que está longe de cicatrizar. A cultura da violência, reforçada ao longo dos anos como uma das marcas mais fortes e dolorosas da sociedade americana (seja através da repressão bélica ou simplesmente hierárquica); a imposição de um modus vivendi centrado no individualismo, onde o coletivo funciona à base do nivelamento político-ideológico consciente; grandes corporações e seus olhos abertos, interferindo, abusando, controlando; a ambição humana potencializada pela insatisfação - com a estabilidade, com o cônjugue ou com o corpo; e o dinheiro, sempre ele, eixo central que move uma engrenagem em forma de continente que acaba por mover o mundo. Queime Depois de Ler possui o mesmo tom trágico e cruel de Onde os Fracos Não Têm Vez, e as poucas risadas que surgem são pontuadas por um desconforto que mostra o quão sombria é a visão que os irmãos possuem sobre os jogos de poder - por menores e menos significantes que sejam as estruturas a partilharem desse bolo, como uma simples academia de ginástica – que acabam por infectar um mundo já há muito corrompido. O termo comédia precisa ser repensado de acordo com suas exigências de gênero caso pretenda servir de referencial para este filme. E, se mesmo assim estivermos diante de uma, Queime Depois de Ler cresce na memória à medida que se afasta progressivamente dos risos.
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