[1:39 AM]
Quando eu vejo o trabalho de espetacular imersão na personagem que a Juliette Binoche exerce em A Viagem do Balão Vermelho, carregando a ironia maior de ir contra o que os manuais expressivos de representação pregam, é que eu me vejo mais afastado desses filmes de Oscar que estão em cartaz - cujos títulos eu sempre confundo -, que todo ano provam a onipresença irritante da Meryl Streep e do Philip Seymour Hoffman, pra ficar em apenas dois nomes. Simplesmente não consigo olhar para Meryl Streep e ver um personagem na tela, qualquer que seja. O que eu vejo em todos seus filmes (à exceção de As Pontes de Madison, sua última grande atuação) é Streep fantasiada, de freira durona ou editora diabólica, calculando minuocisamente as contenções, explosões ou outros movimentos faciais e corporais que vão guiá-la até sua 87ª indicação ao Oscar de melhor atriz. Esse falso naturalismo encheu o saco. A fantasia não cola mais. Onde está Gena Rowlands para ensinar essa gente toda a atuar, a esquecer que há uma câmera, uma claquete e um grito de "ação!" e que, mais consistente do que esse frágil modelo de representação (que pode facilmente decretar falências artísticas devido ao seu caráter fraudulento - Kidman, Zellweger, Jolie, Carrey etc.), não só cria uma ponte ainda maior entre cinema e espectador como também coloca todo um conceito de atuação estabelecido e consagrado em plena crise? É o conflito que faz engrandecer qualquer discussão. Binoche some no filme, sua generosidade é tão bem colocada em cena que ela honra os limites de sua imagem e acaba assim riscando exageros e outras firulas de seu dicionário expressivo. As nuances são todas certeiras. A moça flutua entre pólos opostos da subjetividade feminina moderna sem em momento algum apelar por um espaço maior em cena, pela atenção individual do espectador ou do texto em si. A tradução corporal de seus conflitos emana uma grandeza de alma que só as grandes atrizes possuem. Hoje, no mundo, ninguém está no páreo dela e de Isabelle Huppert. Não só pelas atuações, mas pelas escolhas, pela ousadia artística e por saberem, antes de tudo, respeitar seus personagens. O que Binoche faz na tela justifica adequadamente a existência da palavra sinestesia, e ainda é capaz de legitimar as pretensões do cinema enquanto arte maior - vide qualquer fotograma de A Viagem do Balão Vermelho, um filme para se carregar apertado, embaixo do braço, pelo resto da vida.
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