[2:32 PM]
“Eu sei que você não agüenta mais me ouvir, Melanctha, mas veja, comigo é assim. Sempre. Você se lembra do que eu lhe disse, quando ainda não nos conhecíamos tanto, de como eu conhecia apenas dois tipos de amor, um familiar e o outro animal, e de como eu não gostava desse último? Sabe, Melanctha, comigo é assim. Aprendi um sentimento novo com você, que é como uma nova religião, e vejo que o amor deve ser desse jeito: dividir tudo com alguém, descobrir novas sensações, coisas que antes eu julgava más, como que para formar um só sentimento. É assim que você me faz ver o mundo; eu não sabia que todos os tipos de sentimento se juntavam para formar um só amor de verdade. Às vezes sinto isso do jeito que você me ensinou, e nesses momentos amo você, Melanctha, com se tivesse encontrado uma nova religião, mas depois percebo que não sei nada sobre você, minha querida, e percebo de repente que eu talvez esteja errado de pensar desse jeito tão amável, descartando minhas velhas idéias sobre o tipo de vida correto para nós, as pessoas de cor, e então penso, Melanctha, que você é uma pessoa má, e penso que estou agindo assim por estar ansioso para experimentar todas as excitações, como não fazia antes, e nesses momentos não posso evitar de ficar bravo com você, pois se pretendo agir corretamente, tenho que fazer as coisas direito. Eu queria agir de forma correta, é a única forma que conheço, e não vejo meio de saber o que é melhor: se o meu pensamento antigo ou o novo jeito de ser, que você faz parecer tão religioso. Não sei qual é a forma certa de pensar, e por isso fico tão triste de lhe causar tantos problemas e machucar você dessa forma. Será que você não poderia me ajudar, Melanctha, a fazer o que é certo, de modo que eu saiba exatamente como devo agir? Nunca quis ser covarde – se ao menos soubesse com certeza qual é a forma correta de agir. Será que você não poderia me ajudar a encontrar o que é verdadeiro, Melanctha querida? Sempre quis saber como agir.”
Três Vidas, Gertrude Stein
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