qualquer coisa
num verso intitulado mal secreto
 

24.4.09


[5:06 AM]


- James Gray, com apenas quatro filmes, será membro do júri de Cannes esse ano (presidido pela Isabelle Huppert, aliás). Esse aí em cima é o pôster do mais recente deles, Amantes, que já está disponível na internet mas deve estrear por aqui em breve, e é inspirado no livro Noites Brancas, do Dostô. Uma leitura deliciosa e que você faz em uma madrugada, pode confiar. Mesmo que o filme não corresponda às expectativas que eu carrego comigo desde que foi exibido e bem recebido ano passado no mesmo Festival, já irá valer a pena por manter acesa uma chama que eu espero não minguar tão cedo, que é a da minha relação com o cinema. Mas, a julgar pelo trailer e pelo cartaz, pode ser que nossa listinha de filmes do coração ganhe mais um componente. Sem falar que a seleção de Cannes esse ano tá barra pesada, dá só uma olhada.

- Ontem assisti Felicidade, do Todd Solondz, que me foi emprestado por um cara lá da livraria juntamente com O Pântano, da Martel, que eu já tinha visto mas queria muito rever. Não vou falar que fui ao filme do Solondz de braços abertos e receptivo, porque o problema em trabalhar com pessoas bem informadas é que elas acabam suscitando umas discussões imediatas e acaloradas que terminam por influenciar de alguma maneira minha visão sobre as coisas. E quando fiquei sabendo que se tratava de um tema tão recente e infelizmente já tão desgastado por uma galera despreparada - o universo disfuncional da classe média norte-americana -, fiquei com uma preguiça enorme e acabei deixando o filme de lado por uns dois meses. Até o cara vir me cobrar uma opinião e os filmes (na verdade muito mais os filmes do que uma opinião, eu sei), e eu tive que sacrificar minha leitura de madrugada em prol de uma sessão de tortura de quase duas horas e meia. Porque sim, Felicidade nada mais é do que uma afronta à minha inteligência, um filme que me agride de maneira quase física por já entrar em campo me tratando como um imbecil incapaz de pensar. Reduz as pessoas às suas esquisitices e se mostra tão frágil que sequer oferece oportunidade de libertação, se contentando apenas com a pobreza do fetiche pelo bizarro. Essa é a palavra: pobreza. E ainda somos obrigados a ouvir diálogos tão mal estruturados como aquele que é disparado o pior do filme, embora a briga pela posição seja boa, entre o pai pedófilo e seu filho: “ - Pai, você me foderia? – Não, no máximo tocaria uma punheta.” Depois dessa, tiro meu time de campo e peço pra sair.

- Mas há salvação, e, como não poderia deixar de ser, ela parte de um Samuel: agora que meu devedê estragou de vez, fui procurar abrigo em Cão Branco, do Fuller, um tipo restrito que ainda faz a gente crer na existência plena da expressão obra-prima. Pois, se aquele-que-não-deve-ser-nomeado (ou: o filme citado ali em cima) se satisfaz em escancarar as excentricidades de um núcleo social de maneira redutora e simplista, Fuller usa a violência para compor um painel de alta complexidade acerca das forças da natureza e das vãs tentativas humanas em se sobrepor a elas. Olhando por esse viés, é um filme que dialoga com a visão do Herzog sobre o tema e acaba por se alinhar a ela ao ressaltar a tirania indiferente da natureza sobre todas as coisas. Para quem como eu que achava o jumento Balthazar de A Grande Testemunha o melhor registro animal já feito no cinema, Cão Branco vem raivoso derrubando paradigmas e derivativos para se impor no topo dessa cadeia. Fuller não se dá por realizado ao esbarrar em soluções fáceis, como duas balas de revólver que resolveriam qualquer problema, e prefere acreditar que não há sucesso sem tentativa, nem glória sem esforço. E o filme se desenvolve nessa delicada linha entre a mais bruta violência animal e a força de vontade da perserverança humana, duas manifestações distintas que não demoram a romper a harmonia de uma relação que quase sempre flerta com o trágico. Fácil, fácil um dos grandes filmes dos anos 80.

- Melancia sem semente e Hot Buttered Soul às três da manhã, num volume exageradamente alto para a hora. Porque se o Carpenter já colocou o Isaac Hayes como "O Duque" em Fuga de Nova York, quem sou eu para contestar essa posição?



 


é isso aí, bicho

 

 


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