[2:19 PM]
Perdeu. Fico com ela para abrir o show na minha garagem. Perdeu é a minha melhor música desse disco novo. Distorções, falsete, bateria acompanhado a guitarra, final explosivo, sexual, dia frio numa praia do Rio. O melhor jeito de se ouvir Zii & Zie e tentar captar a atmosfera que o Caetano quis transpor para o disco é durante um passeio de carro pela orla carioca, com o som bem alto, as janelas abertas, o vento entrando furioso enquanto a garoa molha o vidro da frente e os dois retrovisores. Não é conciso como o Cê, as letras contrapõem a escrita sintética do disco anterior, as referências chovem e se voltam cada vez mais para o universo tipicamente brasileiro do cara. Diria que Caetano flexibilizou as propostas de renovação apresentadas em Cê, de modo que não só a banda está muito mais afiada como também se permite alçar vôos maiores (o baixo soturno de Ricardo Dias Gomes encobre todo o disco como uma nuvem pesada, prestes a desabar numa tempestade; ao passo que Marcelo Callado e sua bateria acompanham com personalidade, dando o ritmo e a batida que o projeto de samba tanto pedia). No geral, é um disco que soa um tanto quanto irregular, assim como o anterior, mas cujos muitos momentos de brilhantismo (e coloque aí a linda recriação de Incompatibilidade de Gênios, o samba de Lapa, o frescor de A Cor Amarela, o instinto de Sem Cais e também o rap de A Base de Guantánamo) o colocam bem acima da média no que tange à música pop brasileira dos anos 2000. Seus discos, desde o primeiro, lá em 1967, são fortes o suficiente para soarem intransitivos, sobrevivendo às comparações e com uma riqueza sonora e textual que poucos conseguiram alcançar. Zii & Zie, portanto, não é mais um. É um disco de Caetano Veloso quarenta e dois anos depois, com todas as misturas e experimentações e inquietações que sempre transbordaram pelos cantos de toda a obra do artista baiano, seja ela escrita, cantada ou filmada. Assumindo o papel de um autêntico zii carioca, Caetano se mostra menos estrangeiro ao fazer um disco para ser apreciado e ouvido com os olhos livres e a cabeça aberta - brilhando, piscando, ardendo, resplandecendo a nave da cidade.
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