[1:45 PM]
"Minha mãe sempre percebe quando não dormi em casa, e embora naturalmente não fale nada, pois seria absurdo se falasse, por um ou dois dias me olha entre ofendida e hesitante. Sei muito bem que jamais lhe ocorreria contar para Irma, mas de qualquer forma me aborrece a persistência de um direito materno que já não se justifica, e sobretudo que seja eu quem deva aparecer, no fim, com uma caixa de bombons ou uma planta para o pátio, e que o presente simbolize de forma muito precisa e subentendida o fim da ofensa, o retorno à vida diária do filho que ainda mora em casa da mãe." "Nunca entendi muito Cora, mas daquela vez bobeei mesmo. Na verdade, não me incomodo de não entender as mulheres, a única coisa que vale a pena é que elas gostem da gente. Se estão nervosas, fazem de tudo um problema, bem, mocinha, pronto, me dá um beijo e ponto final. Vê-se que ainda é novinha, vai demorar um bocado até que aprenda a viver nesta profissão maldita, a coitada apareceu esta noite com uma cara estranha e levei meia hora para fazê-la esquecer essas bobagens. Ainda não descobriu a maneira de tratar certos doentes, já aconteceu o mesmo com a velha do 22, mas eu supunha que, a partir de então, tinha aprendido alguma coisa, e agora esse menino vem lhe dar dor de cabeça. Ficamos tomando chimarrão no meu quarto e lá pelas duas da madrugada ela foi dar a injeção no menino, quando voltou estava de mau humor, não queria nada comigo. Fica-lhe bem essa carinha contrariada e tristonha, que aos poucos foi se modificando até que finalmente começou a rir e me contou suas aflições, nessas horas gosto tanto de despi-la e ver que treme um pouco como se sentisse frio."
O Outro Céu e A Sra. Cora , Julio Cortázar.
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