[2:41 AM]
A instabilidade é que dá o tom em Vício Frenético, um filme nervoso que oscila em suas diversas pulsações ao lançar um olhar ácido para os Estados Unidos do século XXI. Como que perfurada por uma lâmina afiada, que impede o repouso ou mesmo momentos de menor inquietude, a narrativa moldada por Herzog acompanha a trajetória de um policial cuja lei é reinventada diariamente de acordo com suas necessidades. Viciado em drogas, corrupto e inescrupuloso, o impulsivo e complexo tenente interpretado por Nicolas Cage vaga pela desordem da cidade revelando um painel de pequenos conflitos e relações tumultuosas, cujo ritmo truncado imposto por Herzog faz com que cada sequência soe como uma pontiaguda pedra no sapato.O cenário é New Orleans, cidade norte-americana devastada pelo furacão Katrina, e embora isso não fique claro em momento algum, a inconstante relação entre homem e natureza, tema recorrente da filmografia de Herzog, dá algumas pistas de que a violenta manifestação natural acabou por atingir as estruturas sociais da cidade e potencializou a deformação do caráter de alguns de seus habitantes. Se o homem é o reflexo do lugar onde vive, o que esperar de um tira cercado por ruínas, sujeira, corrupção, agressividade animal e tensões de todos os tipos?Vício Frenético, que sabiamente procura distância do filme homônimo dirigido por Abel Ferrara em 1992, mostra um olhar externo para um país cujas feridas aparecem cada vez mais expostas, seja em função de ataques terroristas, de governos despreparados, crises econômicas ou de perturbações climáticas. O que Herzog quer nos mostrar é que alguma coisa está fora da ordem. O que, propriamente, não se sabe. Através de sequências poderosas, como a da extorsão do casal de jovens no estacionamento, cuja construção lida com a tensão de forma progressiva e magistral, é possível delinear um olhar para um homem em transe, com os instintos à flor da pele, recriando códigos morais à sua maneira e sem saber para onde ir, com o norte tão anuviado quanto o de seu próprio país.
|