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Quando se fala em cinema iraniano, automaticamente pensamos em assuntos ligados à religião, fanatismo, guerra e mumunhas políticas tediosas e desinteressantes. Por isso foi grande minha surpresa já nos primeiros minutos de Procurando Elly, filme que veio lá do Irã e que dispensa todos os substantivos citados acima para contar uma história de mistério sobre uma moça que desaparece durante um fim de semana na praia com amigos. A narrativa se constrói sob a ausência da personagem, que, sem estar lá, acaba se tornando o eixo central a partir do qual todo o enredo se desenrola, tal qual Rebecca, a Mulher Inesquecível de Hitchcock e Demência 13 de Coppola. A primeira metade do filme, ocupada em familiarizar o espectador com o universo daqueles jovens, revela uma intimidade e um clima amistosamente tão confortável que parece não haver necessidade de uma guinada na trama. Há potencial para uma história baseada somente na interação daqueles instantes. É um apontamento que o cinema vindo do Irã parece não se cumprir a registrar e que Procurando Elly domina com total êxito: o cotidiano e as relações entre os jovens, suas brincadeiras, provocações, piadas, todo o cosmo dos costumes de um povo que julgamos viver em outro mundo e que aos poucos também vai se tornando nosso.E aí Elly some. Do nada. Ninguém viu para onde foi, se fugiu pela estrada ou se se afogou no mar. O filme então se vale de sua ausência para torná-la mais forte, fazer do desaparecimento de sua figura o epicentro dos terremotos que hão de abalar o grupo. Nesse jogo de crescente expectativa, onde pipocam indagações pessoais e morais, descobrimos que pouco ou quase nada sabemos sobre o passado de Elly. E, quanto menos sabemos dela, mais nos aproximamos do seu grupo de amigos. O temperamento de cada um, suas aflições, seus rompantes de fúria, a casa fica pequena para comportar a personalidade de cada um.Ao lançar um olhar para a dinâmica circunstancial das relações entre esses personagens, aos poucos a solução do mistério vai ficando para trás e a tensão fica por conta de como o grupo reagirá a cada nova descoberta sobre o passado de Elly. E os olhos vidrados na tela, hipnotizados. Não há hierarquia: somos tão cúmplices quanto os outros personagens. Lembrei de Rebecca várias vezes, subestimado filme do Hitch (embora tenha vencido o Oscar de Melhor Filme em 1940 - e era só o primeiro projeto do gordo inglês em solo americano!). O iraniano Asghar Farhadi contrariou preconceitos geográficos e fez um grande filme se valendo de uma casa, um mistério e uma anti-personagem. Ao final, embora não fosse necessário, ainda nos oferece respostas. Talvez inspirado no boa praça Ahmad, que a certa altura diz: "É melhor um fim amargo do que uma amargura sem fim". Procurando Elly (Darbareye Elly, Asghar Farhadi /2009)
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