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Quando escolheu usar atrizes para encenar depoimentos reais, em "Jogo de Cena", o que estava querendo investigar? Ficou claro para mim que o público sempre foi ver meus documentários porque o ato de narrar das pessoas é mágico. Por que interessa uma narração? Porque conta que matou o pai? Não é só isso. É porque a pessoa conta sua história com uma sintaxe, um vocabulário, uma força expressiva extraordinária. É um elemento ficcional, do imaginário, que é muito mais poderoso do que o real. Você conta a sua infância e é uma infância que está na sua memória, feita metade de esquecimento, metade de verdade. O que é verdade? Isso passa a ser totalmente desimportante. O que acontece na filmagem é verdade. Se uma pessoa me conta uma coisa que me pareça verdadeira, é verdade e ponto final. Não vou no Google checar. Uma garota de programa me disse que era uma mentirosa verdadeira - que é uma definição de documentário. Disse que inventou uma avó, mas tinha que contar muito bem a história, até que passou a acreditar que tinha avó. Esse negócio de mentira e verdade é um jogo de cena. As pessoas exprimem suas paixões, seus anseios, e sempre o falso está junto com o verdadeiro. Por que não ter atrizes, se as histórias são tão produto do imaginário? Ninguém é dono da sua história. A dor da atriz é fingida, e é melhor do que a sua. Isso socializa a fala, que é de todo mundo e de ninguém.Eduardo Coutinho em entrevista para a Revista de Domingo do jornal O Globo do último dia 7.
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