qualquer coisa
num verso intitulado mal secreto
 

12.3.11


[7:02 PM]


Certa vez contei a uma amiga os meus planos de escrever um roteiro sobre a história de uma mulher que, insatisfeita com as constantes decepções vividas no dia-a-dia, resolve devolver para o mundo através de ações pequenas as pancadas que recebeu durante toda a vida. Ela me questionou: “Mas qual a motivação dela? Você precisa ser mais claro”. Não lembro exatamente o que eu respondi, mas foi algo em torno de “mistério sempre há de pintar por aí”. Que é meu lema, aliás. Não senti necessidade, ao delinear as formas daquele texto na minha cabeça, de explicar quais seriam (e se de fato existiam) as razões para o enlouquecimento lento e gradual daquela mulher. Todas as mulheres vivem sob influência, e não precisa ser ginecologista ou uma delas para saber disso. Basta ligar em um daqueles dias errados por natureza.

Lembrei disso enquanto assistia Cada Um Vive Como Quer, filme de 1970 dirigido por Bob Rafelson. Nele, Jack Nicholson é um operário que sofre de insatisfação crônica, talvez pela relação conturbada com a família, ou pelo vazio que toma conta de seu relacionamento com uma garçonete sem ambições, ou por viver sempre à margem, desajustado, tentando se realocar em algum lugar e falhando sempre. Durante todo o filme, em nenhum momento vemos o local onde o personagem de Nicholson mora. O movimento é sua reza, o único lugar onde ele encontra tranqüilidade de espírito e acalma sua consciência. Tanto o movimento das estradas, dos carros, dos corpos, quanto o movimento da música. Por isso ele está sempre em fuga.
É interessante notar como uma composição tão complexa encontrou nas múltiplas variações expressivas de Jack Nicholson seu interlocutor ideal. Como caracterizar um personagem que não se sente à vontade com ninguém, em lugar algum, e mesmo assim transmite uma energia tão potente sobre o ambiente ao seu redor que acaba nos aproximando de uma compreensão que nem mesmo ele conhece?
O mesmo Jack, em Passageiro Profissão: Repórter, de Antonioni, invalida sua existência e assume o lugar de outro homem com o intuito, assim imaginamos, de começar uma nova vida. Mas por quê? O que o leva a fazer isso? Não é preciso explicar.


O mistério das coisas é o que mantém elas vivas.



 


é isso aí, bicho

 

 


[ eu ]

samuel lobo
24
brasil
 


[ leio ]

caderno do cinema
filmes do chico
mesmas letras
trabalho sujo
chip hazard
superoito
passarim
 
[ visito ]

cinética
ilustrada
cinema em cena
IMDb
 
[ estante ]

last.fm
twitter
rym
mail
 
[ arquivos ]

novembro 2005 maio 2006 agosto 2006 setembro 2006 outubro 2006 novembro 2006 janeiro 2007 fevereiro 2007 março 2007 abril 2007 maio 2007 junho 2007 julho 2007 agosto 2007 setembro 2007 outubro 2007 novembro 2007 dezembro 2007 janeiro 2008 fevereiro 2008 março 2008 abril 2008 maio 2008 junho 2008 julho 2008 agosto 2008 setembro 2008 outubro 2008 novembro 2008 dezembro 2008 janeiro 2009 fevereiro 2009 março 2009 abril 2009 maio 2009 junho 2009 julho 2009 agosto 2009 setembro 2009 outubro 2009 dezembro 2009 janeiro 2010 fevereiro 2010 março 2010 abril 2010 maio 2010 junho 2010 julho 2010 agosto 2010 setembro 2010 novembro 2010 janeiro 2011 fevereiro 2011 março 2011 abril 2011 maio 2011 junho 2011 julho 2011 agosto 2011 setembro 2011 outubro 2011 dezembro 2011 janeiro 2012 junho 2012