[11:49 PM]
A última página de A Chuva Imóvel (1963), de Campos de Carvalho:“Tentaram reduzir-me a pó e não me reduziram, aqui estou eu com a minha corda e com a minha consciência, íntegro e íntegro, fora do alcance de suas armas de longo alcance, de suas experiências homicidas ou suicidas, fora do seu sistema solar ou de qualquer outro sistema – eu o rebelde, o rebelado, mesmo que apenas um desertor: o desertor no deserto.Levarão séculos para me içar, se é que estão realmente içando, e enquanto dure esta longa ascensão do meu cadáver, mas também do que está dentro dele, eu e não ele – continuarei minuto a minuto a cuspir-lhes do fundo da minha consciência, com esta corda no pescoço mas cuspindo, em sinal de protesto e sobretudo de nojo – por mim e por todos esses que morreram nos meus testículos, que morreram ou que estão morrendo, juntamente comigo morrendo, nesta matança dos inocentes.Mesmo morto continuarei dando meu testemunho de morto. Esta chuva imóvel serei eu que estarei cuspindo.”

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