[12:51 AM]
Sobre o filme do Nelson: olhar direto, sem sobras. Pela objetividade com que constrói a narrativa, sem recorrer a exotismos ou soluções rebuscadas, primando sempre por um alto poder de síntese visual, era ele o sujeito mais adequado para realizar a adaptação para o cinema da obra igualmente concisa de Graciliano Ramos. Com um olhar destes, você precisa de mais o quê? Só as expressões por si só encerram um oceano de questões. A tentação mais fácil seria render-se a um painel vitimizador, esgotando as potências do universo retratado por meio de estratégias superficiais que buscam a compaixão do espectador. Mas é bom lembrar que Nelson veio antes de todos, e a ele não interessa o simples juízo de valor, a análise social rasa e de fácil assimilação. O que expulsa as pessoas do sertão é a carência de perspectivas, a terra que não dá, a falta de água e de recursos primordiais a uma existência digna. Tudo falta – exceto luz. E é a luz que impulsiona os nordestinos a seguir em busca de uma sombra que nunca chega. A luz cegante, que se derrama sobre os vastos descampados do sertão, rachando o solo e dizimando todas as possíveis formas de vida. A luz em Vidas Secas é cruel, cortante, porque real. O branco inunda a tela, e ao castigar os personagens faz com que nossos olhos permaneçam abertos o tempo inteiro, para que possamos, sem precisar recorrer a artifícios externos, nos aproximar silenciosamente daquela realidade, do ar quente, do suor que não cessa, da luz que não sossega. Em Vidas Secas o sertão nos atravessa.
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