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A Separação, de Asghar Farhadi (2011) Fui ao cinema de teimosia, morto de sono, mas não quis perder a chance de assistir ao novo filme do iraniano Asghar Farhadi. Quem diria que um dia eu esperaria com ansiedade por um filme iraniano. O lance é que o longa anterior do sujeito, Procurando Elly, um suspense hitchockiano de primeira, me pegou de jeito. Foi contra todas as expectativas que eu reservava às produções cinematográficas vindas das bandas de lá. Nada de aridez, discursos políticos inflamados, calor ou a postura vitimizante que a imprensa ocidental costuma vender do país em função de seu governo. Uma história de mistério, trabalhada nas relações entre os personagens a partir do cotidiano de jovens iranianos e com um corte herdado de Rebecca – A Mulher Inesquecível, primeiro filme norte-americano de Alfred Hitchcock. A história de A Separação, tal qual a de seu antecessor, parte da ausência. Quando a mulher resolve pedir o divórcio para deixar o país em busca de melhores condições de vida, o homem, resoluto, decide arcar com as responsabilidades e permanecer no Irã em função de seu pai, que tem Alzheimer. A mulher se desloca dentro da narrativa, mas não para fora, como Elly, e sim para o fundo. Sua presença paira no ar como a causa e a possível solução para todos os problemas. Começa então uma reflexão sobre as disposições sociais atravessadas pela mentira, pela religião e por conceitos éticos, todos filtrados pelo olhar não corrompido de duas crianças. Em tempos de fragmentação e sobrecarga de informações, um dos antídotos usados por vários cineastas contemporâneos está na proposição de uma composição de imagem calcada em planos longos e estáticos, onde pouca coisa parece acontecer. Farhadi vai na contramão. É um cineasta de planos curtos, rápidos, de cortes secos que alimentam a tensão e adiam a conclusão dos conflitos (alguns até por tempo indeterminado, como mostra o último plano do filme). E sabe filmar muito bem dentro dessa proposta. Em momento algum soa afobado ou com pressa de concluir os conflitos que se ramificam e se intensificam a cada encontro. A primeira cena já nos dá a noção de que o texto é um dos pontos fortes do filme, e a maneira com que Farhadi articula o fluxo de acontecimentos por meio de situações poderosas, que questionam conceitos de integridade pessoal e impedem a harmonia social, ancorado por um elenco soberbo, justifica o prêmio de melhor filme no Festival de Berlim este ano e afirma A Separação como uma das mais potentes obras da atualidade.
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